sábado, abril 15

BOM DIA JOTA VILELA

(imagem - "Jamás Olvidarás" por Juanco Lasso)


JOTA VILELA é poeta e amigo, nos brinda diariamente com um bom dia poético, esse é um dos mais bonitos que já li, dito no dia 05/04/2006.

Não conseguir enfrentar uma terra branca é a atitude dos corajosos.
Abandonar, resistir, enuncio bóias de sinalização, instantes avulsos, as conversas por dentro dos marcos de correio, os pés nus em frente ao mar, eu dentro de um barco, eu dentro de ti a encostar-me a um espelho.
Se esta manhã de estradas e cortinas fosse um prato sobre o qual aquecemos as mãos abraçava-me a ti com as minhas carruagens como se nunca tivesse existido para lá de uma linha ou de uma âncora.
Andar sobre a neve é o mesmo que atravessar o leito deste rio é o mesmo que interrogar o universo ou que falar de mim.
Andar sobre folhas secas é provar uma romã e deixá-la sobre um banco na cidade dispersa.
Andar na tua voz é o mesmo que esperar debaixo de uma varanda a chegada do autocarro num dia de chuva ou dormir na copa das árvores embrulhado em panos.
É andar no dorso dos peixes.
Eu quero o cais - só preciso de um pano para me transformar.
Sou um dia inteiro para despir árvores.
O meu nome é uma ponte que se olha depois de atravessada.
Sou um barco intenso cor de laranja e revolvo em torno raízes púrpura.
O meu andar é um mergulho irrepetível no centro da terra e trago na voz os acenos quentes dos patos bravos sobre a casa reencontrada.
O linho, o azeite, o pão, os pés frios.
Conheço o fim que povoa a dúvida das montanhas e das bibliotecas.
Nasci numa rua onde os peixes são verdes e os planetas se encostam ao muro exaurindo vulcões.
Os meus dedos são e só podem ser agulhas que pendem de uma alma distante como um amigo ou um palhaço.
Quando se chegam da cerca como se se escondessem numa fogueira seca ou se abandonassem na estrada, retraem-se dos corpos avulsos que discutem entre si.
Cheiram a lã e mostram uma vela ou uma vida imaginada.
O tempo ri-se em cornucópias que se extinguem já.
Eu só quero essa vela até ao fim.
Que lembra a vida dos insectos e dos meus antepassados.
Eu sou a criação e o fruto.
E sento-me em frente a esta viagem sentindo os aviões ou o chamar das cartas escritas que inunda o esquecimento de desenhos e flores secas.
Canções infantis.

Um comentário:

Anônimo disse...

Excellent, love it! »