domingo, agosto 14

EU, MEU PAI E A PESCARIA.


Neste dia dos pais, deixo um texto que fiz especialmente pra ele.

EU, MEU PAI E A PESCARIA.

Existem coisas na vida que jamais conseguimos esquecer. Uma lembrança que me faz brotar lágrimas nos olhos é dos momentos que eu tinha a sós com meu pai.

Sou de uma família de dez irmãos, a nona da escala - um irmão mais novo que nasceu especial – para conseguir chamar atenção dos pais era muito difícil e concorrido.

Quando eu tinha por volta de 10 anos ou mais, nem me lembro ao certo, meu pai voltou a pescar. Coisa que não fazia há muito tempo e só após a aposentadoria pôde retornar.

Às vezes íamos todos no velho Simca que meu pai comprou apenas a casca e como mecânico que era, foi montando em casa. Fazíamos uma farra na beira da represa Billings, íamos num lugar um pouco mais longe chamado Mar Pequeno e lá passávamos o dia todo, era só diversão.

Mas eu adorava quando ia apenas eu e o meu pai, só nós dois. Ele me chamava por volta das 5 horas da manhã, bem baixinho para que o resto da família não acordasse. Era como se fosse Natal e ele o Papai Noel, uma alegria imensa tomava conta de mim, ia passear com o meu pai, só eu e ele.

Pegávamos um ônibus até o centro da cidade de Mauá, depois o trem até Ribeirão Pires e daí até a beira da represa: íamos a pé. Carregávamos tudo, varas de bambu desmontadas, paus de seva - cabos de vassouras com emendas que unidos iriam levar um chumaço de capim amarrado na ponta - capim fresquinho para isca, samburá, pão com margarina, bananas e água, além de tudo o que se usa na pesca.

Não sei exatamente a distância que percorríamos a pé, mas para minhas pernas curtas era bem longe mesmo, e não era fácil acompanhar os passos largos das enormes pernas do meu pai.

Quando chegava pertinho da água eu delirava de vontade de pescar, queria ser a primeira a ter a vara pronta, colocar a isca na água e pegar o primeiro peixe. Não admitia voltar sapateira. E ali assistíamos o nascer do Sol.

E o Seu Antonio Vilela, meu pai, me ensinou tudo: montar a vara, amarrar a linha, colocar a bóia, o anzol, fazer uma tirinha com o capim e passar delicadamente, sem rasgar, nos dois anzóis que usávamos, ensinou todos os truques da pesca - bem baixinho para que ninguém ouvisse. Nestas horas o pai era só meu, eu nem lembrava de casa, de mãe ou de irmãos. E ele tinha um orgulho de me ver pegar os peixes, era só sorriso e alegria.

E quando a chuva apontava lá longe? Que delícia! Muitas vezes entrávamos dentro da água quentinha para não perder nem um minuto de pescaria, e parece que os peixes gostavam mesmo de fisgar com chuva.

Cobríamos apenas a tralha e os alimentos. Quando víamos a bóia de madeira ficar em pé e depois afundar com tudo, nossa! Não da para explicar a sensação, uma fisgada forte e era aquela briga danada com a tilápia até trazê-la bem pertinho e tirá-la do anzol. E ele me ensinou a pegá-la direitinho por sobre a cabeça, apertando para baixo os espinhos que furam doído demais. E lá ia mais uma tilápia para o fundo do samburá.

Na volta não era fácil carregar todo aquele peso. Mas meu pai vendia os peixes além dos que nós comíamos em casa. Naquele tempo ainda se podia comer peixes da Billings tranqüilamente.

Quando chegava a hora de irmos: já bem no finzinho da tarde, ele tinha que chamar várias vezes. Enquanto ele desmontava as varas e arrumava a tralha, eu ficava lá pescando:
- Só mais esta isca pai;
- Só mais uma puxadinha pai;
- Olha lá, ta cheios de peixes, vamos pescar um pouco mais.

Assim ia até ele dizer que não havia mais tempo, então eu saia correndo para desmontar tudo com pressa.

Íamos andando novamente até a estação do trem, depois um ônibus e casa.

Eu dormia de cansaço até chegarmos, mas feliz da vida com os momentos que pude compartilhar com ele. Durante a noite eu sonhava com as bóias coloridas afundando na água, era quase um vício, mas tinha uma razão de ser: a companhia do meu velho pai.

Uma das ilhas a qual ele pescava na Represa Billings, hoje é conhecida pelo nome de “Ilha do Papai Noel” porque ele lembrava o velho natalino por sua barba e bigode branco. Não tem pescador daquela represa que não o conheço ou não tenha ouvido falar dele.

Meu pai, meu orgulho!


Te amo!

2 comentários:

parla marieta disse...

O que te falar, Verinha?
que você me emociona?
isso já virou chavão.

Anônimo disse...

Meu Deus, quanta sensibilidade! Que amor esta filha tem por este pai!
Quanto orgulho!
Deus,você que é onipotente, multiplicai este exemplo e por certo o Diabo se mudaria definitivamente pras profundas e o verdadeiro amor triunfaria.