Justiça condena lavrador por maus-tratos a uma cadela
Rodrigo Ferrari
Quando alguém tenta se aproximar de Lilica, ela late e rosna sem parar. É que a vira-latas não é dada ao contato com seres humanos. O interessante é que, se não fosse pela ação providencial de um homem, a cachorra de pequeno porte e pêlos cor de caramelo talvez nem estivesse viva. Seria Lilica uma ingrata? Dificilmente. Na verdade, ela quase morreu e a Justiça condenou seu antigo dono, o lavrador Alex Aparecido Caldeira, a três meses e 15 dias de detenção em regime aberto por maus-tratos.
À sentença, rara pela rigidez para este tipo de negligência, ainda cabe recurso. Em 27 de abril do ano passado, a cachorra teve de ser resgatada por militantes da organização não-governamental (ONG) bauruense Nature Vitae no quintal de uma casa na Vila Santa Clara (zona noroeste da cidade), que na ocasião estava desocupada.
Encontrada em meio ao lixo, a cadela aparentava estar privada de alimentação há cerca de 15 dias. “Para sobreviver, era obrigada a comer e a beber os próprios excrementos”, conta a bióloga Fátima Schroeder, presidente da Nature Vitae.
Segundo ela, Lilica ficou quatro meses entre a vida e a morte, mas sobreviveu. Revoltados com a situação, os membros da ONG decidiram mover um processo contra o antigo proprietário da vira-latas. No último dia 5, a Justiça finalmente se pronunciou a respeito do caso.
O juiz Jaime Ferreira Menino, da 2.ª Vara Criminal da Comarca de Bauru, condenou Caldeira com base no artigo 32 da Lei Federal número 9.605, de 1998 (que cita maus-tratos a animais). Além disso, o réu será obrigado a pagar multa de aproximadamente R$140,00 aos cofres públicos.
Caldeira cumprirá a pena em regime aberto. O juiz justificou sua decisão pelo fato de o réu “(...) não ser reincidente específico (não tinha condenações anteriores por maus-tratos a animais), como também pelo fato de ser casado, com família constituída (cinco filhos), ser lavrador e de instrução rudimentar.” Ele foi procurado pela reportagem, mas não foi encontrado. Seus familiares disseram que ele mora atualmente em uma fazenda no município de Piratininga.
Schroeder acredita que a sentença servirá como uma espécie de alerta à população. “Quem sabe, de agora em diante, as pessoas pensem duas vezes antes de maltratar um animal indefeso”, pensa ela.
Como a decisão foi em primeira instância, o réu ainda pode recorrer da condenação. Em depoimento prestado à Justiça, Caldeira reconheceu ser proprietário da cadela. Ele afirmou, porém, jamais ter abandonado o animal. Pela versão apresentada, a vira-latas não teria se ambientado à nova residência da família e insistia em retornar ao antigo endereço.
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Sobrevivente
Os membros da ONG Nature Vitae tomaram conhecimento do caso de Lilica por intermédio do proprietário do local onde a cadela havia sido deixada. “A casa era alugada e o inquilino havia acabado de desocupar o lugar. Certo dia, ele (o dono) resolveu ir até o imóvel para checar como as coisas estavam e acabou se deparando com a vira-latas”, diz Fátima Schroeder, presidente da ONG.
No dia em que foi resgatada pelos membros da Nature Vitae, Lilica nem nome tinha. Na verdade, ela mais parecia um amontoado de pele e ossos, repleta de feridas e secreções por todo o corpo. Amarrada ao cano de um tanque de lavar roupas, ela não era capaz sequer de latir.
Ainda assim, Lilica mostrou sinais de agressividade. Ela chegou a desferir algumas dentadas no consultor de segurança da ONG, Ariel Baptistella, quando ele tentava desamarrá-la. “Ela estava muito fraca e mal conseguia abrir a boca para me morder”, diz ele.
Notícia no Jornal da Cidade - Bauru - hoje